DIREITO ADMINISTRATIVO

Responsabilização estatal por atos praticados por agentes públicos em manifestação popular - RE 1.467.145/PR

Tese(s) Fixada(s):

(I) O Estado do Paraná, em conformidade com postulados adotados pelo Supremo Tribunal Federal na fixação da tese no Tema nº 1.055 da Repercussão Geral, responde objetivamente pelos danos concretos diretamente causados por ação de policiais durante a ‘Operação Centro Cívico’, ocorrida em 29 de abril de 2015. Cabe ao ente público demonstrar, em cada caso, os fatos que comprovem eventual excludente da responsabilidade civil, não havendo coisa julgada criminal a ser observada;

(II) Não se presume o reconhecimento da excludente de culpa exclusiva da vítima unicamente pelo fato desta estar presente na manifestação.”. STF. Plenário. RE 1.467.145/PR. Rel. Min. Flávio Dino, julgado em 29.10.2025 – Info 1197

Parte(s) importante(s) do julgado:

É inconstitucional — por violar o princípio da responsabilidade objetiva do Estado (CF/1988, art. 37, § 6º) e restringir indevidamente o direito fundamental de reunião (CF/1988, art. 5º, XVI) — a tese que condiciona a responsabilização do ente público por danos causados durante manifestações populares à comprovação, pela vítima, de que não estava envolvida na manifestação ou operação policial.”. STF. Plenário. RE 1.467.145/PR. Rel. Min. Flávio Dino, julgado em 29.10.2025 – Info 1197

Conforme jurisprudência da Corte, a responsabilidade civil estatal, em situações de danos decorrentes de atuação policial em manifestações, é objetiva e fundamentada na teoria do risco administrativo, cabendo ao ente público demonstrar, em cada caso concreto, a ocorrência de excludentes, como culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro ou caso fortuito/força maior. (Precedentes citados: RE 1.209.429 (Tema 1.055 RG) e RE 113.587)

Nesse contexto, o Estado deve prevenir atos de violência e preservar a integridade física de todas as pessoas presentes, sejam elas manifestantes ou não, ao passo que o descumprimento desse encargo enseja, como regra geral, sua responsabilidade objetiva.

Na espécie, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, no julgamento de Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva (IRDR), fixou tese que impunha à vítima o ônus de provar que era terceiro inocente, afastando a responsabilização estatal pelo simples fato de a pessoa estar presente na manifestação. Esse entendimento contraria a orientação firmada pelo STF no Tema 1.055 da repercussão geral, segundo a qual não se presume a culpa exclusiva da vítima pelo mero comparecimento ao evento.

O uso da força estatal é legítimo quando for proporcional, necessário e progressivo (Lei nº 13.675/2018, art. 4º, IX). Além disso, os direitos de reunião, expressão e manifestação do pensamento são garantias constitucionais que não podem ser restringidas por condicionantes não previstas na Constituição, sendo importante destacar, ainda, que a responsabilidade civil é independente da responsabilidade criminal (CC/2002, art. 935).

Com base nesse e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, deu provimento ao recurso para reformar o acórdão recorrido, e fixou a tese anteriormente citada.

 

DIREITO CONSTITUCIONAL

Consignação em folha de pagamento de servidor estadual - ADI 5.022/RO

Parte(s) importante(s) do julgado:

É inconstitucional — por usurpar a competência privativa da União para legislar sobre direito civil e política de crédito (CF/1988, art. 22, I e VII) — lei estadual que impõe o cancelamento, pedido por servidor público civil ou militar, das consignações em folha de pagamento relativas a empréstimos pessoais ou a financiamentos, dispensando a anuência da pessoa jurídica credora (entidade consignatária) que estiver sob o regime de liquidação extrajudicial.”. STF. Plenário. ADI 5.022/RO. Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

Conforme jurisprudência da Corte, os estados-membros e o Distrito Federal não podem editar normas disciplinando as relações contratuais nem a consignação de crédito por servidores públicos. Inclusive, a relevância das atividades desempenhadas pelas instituições financeiras públicas e privadas demanda coordenação centralizada das políticas de crédito e da regulação das operações de financiamento (Precedente citado: ADI 1.357). (Precedentes citados: ADI 6.475, ADI 6.451, ADI 6.495 e ADI 6.484)

Na espécie, a lei estadual impugnada versa sobre matéria de direito civil, na medida em que procurou regular aspectos econômicos do contrato de empréstimo bancário. O cancelamento unilateral elimina a garantia do contrato de mútuo e interfere diretamente no pacto firmado entre o tomador do crédito e a entidade consignatária.

Além disso, a referida norma dispõe acerca de matérias disciplinadas na legislação federal, pertinentes ao direito civil e à política de crédito, pois interfere nas regras de recuperação de créditos junto a instituições financeiras em liquidação extrajudicial, bem como nas modalidades e no controle de operações creditícias.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 717/2013 do Estado de Rondônia, que deu nova redação ao § 2º e acrescentou o § 3º ao art. 8º da Lei Complementar rondoniense nº 701/2013.

 

Instituição de política de transição energética justa no âmbito estadual - ADI 7.332/SC

Parte(s) importante(s) do julgado:

É inconstitucional — por violar as competências administrativa e legislativa da União para dispor sobre energia elétrica, bem como por interferir nas relações contratuais entre as concessionárias e o poder concedente federal (CF/1988, art. 21, XII, b; 22, IV; e 175) — norma estadual que obriga as empresas geradoras, transmissoras e distribuidoras de energia a destinarem percentual mínimo de seus recursos a projetos específicos.”. STF. Plenário. ADI 7.332/SC. Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

É constitucional — e não viola o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (CF/1988, art. 225) — a lei catarinense que institui a política de transição energética justa direcionada à redução das emissões de carbono, em especial, a diminuição progressiva do uso de carvão na geração elétrica.”. STF. Plenário. ADI 7.332/SC. Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

Compete à União disciplinar a exploração, a legislação e as condições contratuais do setor elétrico, de modo que apenas lei federal pode fixar percentuais e critérios para aplicação de receitas. Como essa matéria já é regulada pela Lei nº 9.991/2000, com as alterações da Lei nº 15.103/2025, inexiste espaço para atuação legislativa dos estados.

Na espécie, o Estado de Santa Catarina, ao determinar que empresas do setor elétrico invistam, no mínimo, 5% dos recursos destinados à pesquisa em projetos de desenvolvimento tecnológico, além de usurpar a competência constitucional da União, interferiu indevidamente nas relações contratuais entre as concessionárias e o poder concedente federal. (Precedentes citados: ADI 5.927, RE 827.538 (Tema 774 RG) e ADI 3.824)

Na espécie, não há que se falar em proteção insuficiente ao meio ambiente, na medida em que a lei estadual impugnada, em linhas gerais, se limita a enunciar princípios e diretrizes de baixa densidade normativa, isto é, sem estabelecer regras concretas que permitam aferição objetiva de eventual omissão.

A análise dos princípios e objetivos da política pública estadual revela a intenção de compatibilizar a proteção ambiental com o desenvolvimento econômico e social, mediante uma transição gradual, baseada em modelos energéticos sustentáveis e de baixa emissão de carbono, em conformidade com o equilíbrio exigido pela Constituição. Assim, são legítimas as escolhas referentes ao ritmo e à forma de realização dessa política pública.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade do § 5º do art. 34 da Lei nº 18.330/2022 do Estado de Santa Catarina.

 

Multa administrativa: possibilidade de fixação em múltiplos de salários mínimos - ARE 1.409.059/SP - Tema n. 1.244 de Repercussão Geral

Tese(s) fixada(s):

A fixação de multa administrativa em múltiplos do salário mínimo não viola o disposto no art. 7º, IV, da Constituição Federal.”. STF. Plenário. ARE 1.409.059/SP. Rel. Min. Gilmar Mendes, Tema n. 1.244 de Repercussão Geral, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

Parte(s) importante(s) do julgado:

É constitucional — e não afronta o art. 7º, IV, da CF/1988 — o uso de múltiplos do salário mínimo como parâmetro para a fixação de multa administrativa.”. STF. Plenário. ARE 1.409.059/SP. Rel. Min. Gilmar Mendes, Tema n. 1.244 de Repercussão Geral, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

Conforme jurisprudência da Corte (Súm. Vinculante 4), a utilização do salário mínimo apenas como uma referência não configura sua aplicação como indexador econômico, de modo que a vedação constante no dispositivo constitucional acima citado (art. 7, IV, CF) não impede que o valor da multa fixada se dê em múltiplos do salário mínimo. (Precedentes citados: RE 1.318.936 (decisão monocrática), bem como RE 1.367.368, ADI 4.398, AI 387.594 AgR, RE 565.714, ADI 4.637, ADI 1.568, ARE 842.157 (Tema 821 RG) ADPF 325, ADPF 149, ADPF 171, ADI 4.726 e ADPF 151)

Na espécie, diversamente das verbas remuneratórias, o emprego de multas não tem o potencial de gerar efeito de indexação econômica. Trata-se de prestação eventual, não relacionada diretamente com o poder de compra de trabalhadores, e vinculada à violação de obrigações, cuja natureza episódica impede que a multa sirva de base para o reajuste de outros valores ou para a correção monetária periódica.

Além disso, deve-se considerar os efeitos sistêmicos que eventual declaração de inconstitucionalidade da medida geraria: um amplo vácuo normativo e a criação de obstáculos para a atuação fiscalizatória dos Conselhos Regionais e Federal de Farmácia, prejudicando-se a efetividade do controle sanitário.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 1.244 da repercussão geral, (i) deu provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão do Tribunal de origem e assentar a constitucionalidade da cobrança de multas administrativas aplicadas à parte recorrida, nos termos da Lei nº 5.724/1971, bem como (ii) fixou a tese anteriormente citada.

 

Aposentadoria de servidores públicos estaduais: tempo de exercício mínimo na mesma classe ou nível - ADI 7.676/SP

Parte(s) importante(s) do julgado:

São inconstitucionais — pois consideram expressões não pertencentes ao texto da Constituição Federal — normas estaduais que, para efeito de concessão de aposentadorias do regime próprio de previdência dos servidores públicos ocupantes de cargo de provimento efetivo, exigem a permanência mínima de 5 (cinco) anos na respectiva classe ou nível.”. STF. Plenário. ADI 7.676/SP. Rel. Min. Flávio Dino, julgado em 04.11.2025 – Info 1197

Conforme jurisprudência da Corte, o requisito temporal de permanência no cargo, previsto no texto constitucional para fins de aposentadoria, refere-se ao tempo na carreira a que o servidor público efetivo pertence, de modo que não se pode exigir, caso a carreira seja escalonada, que o lapso temporal seja igualmente preenchido em determinado nível ou classe. (Precedentes citados: RE 662.423 (Tema 578 RG) e RE 1.322.195 RG (Tema 1.207 RG))

O advento da “Reforma da Previdência” — promovida pela EC nº 103/2019, que instituiu novos parâmetros para aposentadoria — não alterou essa orientação jurisprudencial, uma vez que suas regras de transição preveem, expressamente, que o requisito temporal é a permanência no cargo efetivo (arts. 4º, IV; 10, § 1º, I, b, e § 2º, II e III; 20, III; 21; e 22). Portanto, seja na redação originária ou na redação alterada, seja no contexto de regras permanentes ou no de regras de transição, o texto constitucional, quando dispõe acerca de aposentadoria dos servidores públicos, não menciona as expressões “nível” ou “classe”. (Precedentes citados: RE 1.517.061 AgR, bem como ARE 1.482.618, RE 1.507.871 e ARE 1.479.231 (decisões monocráticas))

Além disso, o texto constitucional define os limites e parâmetros obrigatórios de simetria para a previdência dos servidores públicos. Ainda que a “Reforma da Previdência” tenha conferido maior autonomia aos entes federados sobre “idade mínima”, “tempo de contribuição” e “demais requisitos” para a aposentadoria de seus respectivos servidores (CF/1988, art. 40, III), esses critérios devem respeitar o bloco normativo federal.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade (i) da expressão “nível ou classe”, constante dos arts. 4º, § 6º, 1, e 5º, § 2º, 1, da EC paulista nº 49/2020, bem como (ii) dos arts. 2º, III, b; 3º; 5º, IV; 6º, IV; 10, IV, § 6º, 1; 11, IV e § 2º, 1; 12, § 2º; 13, III; e 27, caput, todos da Lei Complementar nº 1.354/2020 do Estado de São Paulo.

Informativo n. 1197

11 de novembro de 2025.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - STF